Doping de André Calvelo foi parar no STJD

Decisão da CBDA na tentativa de remediar a situação acabou dividindo opiniões, e agora um dos atletas envolvidos pode acabar injustiçado.

André Calvelo venceu os 100m livre na seletiva olímpica. No dia seguinte foi anunciado que o atleta testou positivo para substância anabolizante. (Foto: Sátiro Sodré)


A Seletiva Olímpica de Natação Brasileira terminou nesse final de semana. Os resultados, de forma geral, ficaram aquém do que os atletas são capazes. No entanto, um ou outro tempo nos impressionou de forma positiva. Foi o caso do velocista André Calvelo, que fez a melhor marca dos 100m livre, no 4º dia de competição.

O balde de água fria veio no dia seguinte, sexta-feira (23/04), quando a CBDA (Confederação Brasileira de Desportos Aquático) foi comunicada pela ABCD (Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem) de que Calvelo havia tido um resultado analítico adverso em um exame antidoping, que ocorreu em 18 de março. Sendo assim, qualquer resultado do atleta posterior a data, deveria ser invalidado, incluindo não apenas a final da prova, mas também a eliminatória.

A final dos 100m livre masculino aconteceu na quinta-feira (22/04), e foi vencida por Calvelo, com um tempasso de 48.15. Com a marca, Calvelo garantiu sua vaga na prova individual em Tóquio e no revezamento 4x100m livre, junto com Pedro Spajari, Breno Correia e Marcelo Chierighini. Em 5°, ficou Felipe Ribeiro, do Unisanta. 

Em uma final de natação, nadam apenas os 8 mais bem colocados nas eliminatórias. Dessa forma, após confirmado o resultado do exame de Calvelo, a CBDA concedeu à Gabriel Santos, 9° colocado na eliminatória, uma chance de nadar uma segunda vez, visto que ele deveria ter se classificado para a final, caso Calvelo não tivesse participado.

Ele então realizou, no sábado (24/04), após o final da etapa, uma tomada de tempo sozinho, nadando na raia 4, sem ninguém ao seu lado. O tempo que ele deveria bater para entrar no revezamento era de 48.87, tempo feito por Felipe Ribeiro na final da prova. Para conseguir vaga na prova individual deveria fazer tempo igual ou abaixo a 48.57, tempo do índice, que fora alcançado na final apenas por Calvelo e Spajari.

Gabriel então nadou sua tomada de tempo em um tempo de 48.49 segundos, qualificando-o tanto para o revezamento quanto para a prova individual. Felipe Ribeiro, que herdaria a vaga de Calvelo no revezamento caso Gabriel não tivesse essa oportunidade, ficou de fora da olimpíada. A confusão foi parar até no STJD (Supremo Tribunal de Justiça Desportiva), onde a convocação de Gabriel está sendo contestada.

O argumento para a contestação é que, em uma situação ideal, Gabriel deveria ter nadado a final na raia 8, junto com todos os outros atletas, sentindo a mesma pressão e ainda cansado da prova realizada pela manhã. Ele nadou em condições privilegiadas, o que pode ter sido o motivo pelo qual conquistou a vaga.
 
Curiosamente, em 2019, uma situação semelhante ocorreu, com os mesmos 3 atletas! Na ocasião, os nadadores disputavam o mesmo Troféu Maria Lenk, como seletiva para o Mundial de Gwangju. Gabriel Santos ficou em 4°, conquistando vaga para o revezamento. André Calvelo ficou em 5°. E Felipe Ribeiro havia ficado em 9° na eliminatória. Gabriel foi suspenso por testar positivo em exame antidoping (ao que tudo indica, o uso de substância não foi proposital, já que a substância era um cicatrizante de tatuagem, mas isso não vem ao caso). Calvelo, que havia ficado em 5°, herdou a vaga, e Felipe, em 9°, nadou a final B, situação na qual ele não poderia se classificar para o mundial, independentemente do tempo.

A principal e determinante diferença entre as duas situações é que, em 2019, o exame de Gabriel havia sido realizado após a competição e, portanto, seu resultado não deveria ser invalidado. Calvelo apenas herdou a vaga porque Gabriel foi banido de competir por um ano.

Existem argumentos para os dois lados e, nem Gabriel, nem Felipe, têm culpa pela situação. Os dois são vítimas de uma das maiores desgraças que existem no esporte, a trapaça. A primeira injustiça ocorreu quando André Calvelo entrou no Parque Aquático e foi permitido competir. Gabriel foi extremamente prejudicado por ter ficado de fora da final, visto que ele era de fato o 8° melhor nadador da eliminatória. No entanto, depois que a final da prova acabou, a injustiça já estava feita. O que a CBDA fez então foi tentar remediar essa injustiça com outra, permitindo Gabriel de nadar nas circunstâncias privilegiadas citadas acima.
 
A preferência da CBDA em relação à Gabriel é clara. De fato, ele possui resultados recentes melhores dos que os de Felipe e foi parte do revezamento 4x100m livre medalhista de prata no mundial de Budapeste em 2017. No final das contas, a CBDA irá fazer aquilo que acredita ser o melhor para a natação brasileira, mas isso não deveria ocorrer de forma que qualquer atleta seja prejudicado.

A resolução do problema parece ser bem simples: levar os dois atletas. No entanto, só podemos levar atletas que nadam apenas o revezamento, e não a prova individual, se conseguirmos as vagas de acordo com os critérios estabelecidos pelo COI (Comitê Olímpico Internacional). Os critérios são: para cada revezamento classificado, o país ganha 2 vagas de atletas "relay only" - atletas que nadam apenas revezamento. Caso as vagas de titulares sejam todas alcançadas, podemos começar a pensar em levar suplentes.

Felipe poderia então nadar apenas no revezamento, e não na prova individual, visto que ele não tem o índice. Nas últimas olimpíadas, os revezamentos brasileiros incluíam 4 nadadores titulares para nadar a final e mais 2 reservas, que podem ser usados nas eliminatórias. Colocar os 2 na equipe, acompanhar o desempenho durante a preparação nos treinos, avaliar os tempos dos 2 nas eliminatórias e escolher quem nada a final já em Tóquio, parece ser a decisão mais justa a se tomar.

Infelizmente, as brigas acerca de quem deve participar da equipe olímpica ficaram tão divididas entre os 2 atletas, que o principal culpado foi esquecido: André Calvelo. Ontem (26/04), foi apurado em matéria do jornal “O Globo”, que a substância encontrada no exame de Calvelo fora drostanolona, anabolizante que ajuda no ganho de massa muscular e de força. Ele ainda poderá tentar provar que a injeção da substância ocorreu de forma involuntária.

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